Esse é meu blog com histórias e lembranças muito antigas, daquelas que desenterramos aos poucos de dentro da gente enquanto vai escrevendo. Descobri esse ótimo exercício. Pode ser que alguma história se misturou à outra ou tenha se perdido no passado, mas raramente é inventada. Somente quem esteve lá pode confirmar. "Daquelas Histórias" é uma homenagem aos meus irmãos Thiago e Amanda.




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sábado, 7 de maio de 2011

QUANDO A GIRAFA VOOU


Adorava balões a gás. Naquela época vendiam em pontos de ônibus e praças. Certa vez amarrei um deles a uma pequena girafa de plástico para que eu pudesse descansar o dedo da linha amarrada. A torneira do quintal estava aberta e a água corria. Distraído, vi a girafa voar a uma altura que eu já não mais alcançaria. Chorei. Acompanhei seu voo de balão até que a vista não pudesse mais alcançar.

terça-feira, 8 de junho de 2010

O ELEFANTE VERMELHO

Em meados na década de 80, acompanhado da turma do Jardim de infância, visitei o Zoológico da Quinta da Boa Vista. Quando de volta ao Colégio, inspirados pelo passeio, foi sugerido pela professora Tia Mônica que representássemos o animal que mais gostamos com massinha de modelar. Fiz um pequeno elefante vermelho. Começando pelo tronco em forma de cilindro, adicionei as pernas, o rabinho, a cabeça e, por último, a tromba e as orelhas. Provavelmente não era a primeira vez que modelava um elefante, pois, em casa, passávamos muito tempo brincando com argila com nosso pai. Tia Mônica saiu da sala com o elefantinho e voltou em seguida com o diretor e várias outras professoras que me levaram para uma sala ao lado. Com um monte de massinha na mesa, pediram que eu fizesse novamente o elefante, provavelmente por não acreditarem que aquela modelagem fosse minha. Chorei muito e, obviamente, recusei. Não sei porque essa história não se apagou da minha memória, visto que eu tinha mais ou menos uns quatro anos e hoje não trago nenhum trauma com massinhas nem elefantes. Se eles guardaram esse elefantinho vermelho no Colégio, deve ter a assinatura de Tia Mônica.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

UMA ESTAMPA MUITO MAIS FINA



Em 1994 presenteamos nosso pai com o mais novo cd de Caetano Veloso, "Fina Estampa", que trazia canções da América espanhola. Ouvíamos compulsivamente aquele disco. Lembro-me perfeitamente de minha irmã aos 10 anos com o encarte na mão decorando todas aquelas letras em espanhol. Por ter marcado muito nossas vidas e principalmente aqueles momentos na casa de Itaipú, a praia, a piscina, os cachorros, resolvi fazer uma compilação com as canções desse repertório na versão de outros artistas, numa tentativa de criar uma estampa ainda mais fina, de imaginar a própria pesquisa de Caetano, incluindo também outras duas canções em espanhol que aprendemos na voz dele. É um presente para meu pai e meus irmãos e uma homenagem ao inesquecível cachorro Apolo. Fina estampa era a cara dele!

LINK PARA BAIXAR: "UMA ESTAMPA MUITO MAIS FINA"


1. Rumba azul – Nila Pizzi
2. Pecado – Roberto Yanes
3. Maria bonita – Julio Iglesias
4. Contigo em La distância – Lucho Gatica
5. Recuerdos de Yparacaí – Jorge Cafrune
6. Fina Estampa – Maria Dolores Pradera
7. Capullito de Alelí – Malena Burke & NG La banda
8. Um Vestido Y um Amor – Fito Paez
9. Maria La O – Ernesto Lecuona
10. Tonada de Luna Llena – Simón Diaz y Ila chester
11. Mi Cocodrilo Verde – Célia Cruz
12. Lamento Borincano – Marc Anthony
13. Vete de Mí – Bebo Valdes y el Cigala
14. La Colondrina - Jerry Fielding
15. Vuelvo al sur - Rocío Jurado
Bônus:
16. Cucurucucu Paloma - Rocio Durcal
17. Cambalache - Carlos Gardel

segunda-feira, 17 de maio de 2010

A HISTÓRIA DA TURMA DO Ã

A turma do à vivia num mundo paralelo durante os anos oitenta e metade dos noventa. As principais características de seus três habitantes eram: as mãos abertas, o queixo levemente projetado para frente, os lábios esticados a modo de mostrar bem os dentes e que salivavam bastante. Eu, Thiago e Amanda encarnávamos essa turma nas horas mais harmônicas de nossa infância, o que acabou atraindo a participação de nossos pais e de alguns parentes na tentativa de comunicarem-se conosco através do gesto, da língua e, principalmente do código Ã. O Isbã era o código que representava um tipo de beijo babado da turma do Ã. Depois surgiu o Isbiluã, um aperfeiçoamento deste, cuja finalidade era deixar a pessoa triplamente babada. Sempre que chegávamos a algum lugar propício - ou não - para fazer nossa clássica apresentação, não pensávamos duas vezes: "Nós somos da turma do Ã!", declamávamos abraçados pelos ombros antes de partir para o ataque de Isbãs. Essas manifestações também aconteciam quando estávamos sozinhos ou com nossa mãe, que era quem mais se parecia conosco quando tentava nos imitar. Hoje a Turma do à está cada vez mais distante de nós, mas será sempre uma lembrança que nos conecta e diverte. Embora sejamos os criadores, pertencemos mais a esse mundo imaginário do que ele à nós.

sábado, 1 de maio de 2010

QUANDO O COELHINHO DA PÁSCOA SE COÇOU.

Era um domingo de páscoa de mil novecentos e oitenta e poucos, em São Gonçalo, e da rua já sentíamos um delicioso cheiro de canjica (mugunzá). Eu, meus irmãos e minha mãe discutiamos sobre as curiosidades da natureza que fazia um coelhinho botar ovos de chocolate tão grandes nessa época do ano. Assim que chegamos à casa de Dona Vanda, mãe de João, namorado de minha mãe, fui recepcionado com um beijo da dona da casa que provavelmente deixara a canjica no fogo para abrir o portão. Dona Vanda tinha um carinho imenso por mim, fazia de tudo para me agradar e sempre achava graça no que eu dizia, até quando minha mãe se irritava com as constantes brigas com meus irmãos. O fato é que Dona Vanda largara em minha bochecha um beijo suado, quente e gorduroso do qual eu não fiz o mínimo esforço em evitar limpá-lo com as costas da minha mão direita. Não lembro se fiz cara de nojo, devo tê-lo feito, mas antes que eu terminasse de limpar minha bochecha melada, fui interrompido delicadamente pelas mãos de minha mãe segurando meu braço e explicando que não era educado limpar o beijo de alguém que gostava tanto de mim como sua querida futura sogra. O vermelho da vergonha nem teve tempo de tomar toda a cara de minha mãe, quando perceberam na minha cara um ar de espanto olhando o umbigo de Seu Edézio, marido de Dona Vanda, que veio logo em seguida tentar me defender, dizendo que meu gesto era coisa normal de criança. Seu Edézio estava suado, e provavelmente limpava o jardim, ou dava banho no cachorro; mas, eu nem me lembro se tinham jardim ou cachorro no quintal. Ao perceber meu olhar intrigante para o umbigo de seu marido, que ficava exatamente na direção dos meus olhos, Dona Vanda constatou que era um enorme carrapato instalado ali naquele inesperado esconderijo, o causador de meu espanto. Dando uma desculpa da qual eu não me lembro, mas deve ter sido algo relacionado com o contato de Seu Edézio com as plantas, ou com o cachorro - acho que Seu Edézio estava mesmo dando banho num cachorro - Dona vanda pediu que tirasse imediatamente aquele bicho nojento. Foi a primeira vez que vi um carrapato tão grande. Provavelmente foi a primeira vez que vi um carrapato, mas, o que me impressionou mesmo foi ter pensado, a princípio, que aquilo seria o próprio umbigo de Seu Edézio. Claro que foi pior saber que era um carrapato, e muito pior quando, ao me responder se carrapato não era coisa só de cachorro como piolho era coisa só de criança, tirou o infeliz do umbigo e matou com uma pedrinha sobre o cimento do muro fazendo explodir uma bolinha de sangue, e disse que o bichinho nojento grudava em qualquer outro bicho que tivesse sangue para se alimentar, mas, que eu não me preocupasse, pois, não era o ser humano seu prato preferido e sim o cachorro. Algumas horas depois, já havíamos esquecido do carrapato de Seu Edézio e do beijo melado de dona Vanda, e a canjica estava muito gostosa. Dona Vanda deixava que a gente adicionasse o quanto de leite condensado quisesse, o que em nossa casa eu não podia fazer. Por alguns instantes comecei a comparar o grão da canjica com o carrapato de seu Edézio, mas não cheguei a verbalizar meu pensamento indigesto, assim como não me lembro de nenhuma outra advertência menos delicada de minha mãe, que, na casa dos outros fazia de tudo para não me bater como era de costume na nossa casa.
Anos depois, já adolescente, algo me fez relembrar o umbigo de seu Edézio. O que provavelmente fez com que esse acontecimento permanecesse até hoje em minha memória sobrevivendo em meio a outras histórias que vivi na infância e que se apagaram com o tempo, como acontece com todo mundo. Estávamos em Santana de Japuíba, na casinha da roça de meus avós, onde passamos juntos os fins de semana por muitos anos: eu, meus avós, Tia Lizete e Luis Armindo, namorado de Tia Lizete. Era manhazinha, quando o mato ainda molhado de sereno guardava surpresas que me faziam andar por todo o terreno logo que acordasse, antes mesmo do café da manhã. Logo em frente a casa, onde a varanda ainda não havia sido construída, deparei-me com um sapo enorme, horroroso e cheio de verrugas que Luis Armindo percebeu primeiro que eram, na verdade, carrapatos. Cada pulo fazia o pobre anfíbio parecer mais feio do que já era, como se o peso dos parasitas que se camuflavam em seu couro o deixasse cansado e triste, algo que ia além da cena inacreditável e grotesca que presenciamos por minha causa antes do café da manhã. Tia Lizete, abismada, entoava suas engraçadas expressões religiosas intercaladas de gargalhadas enquanto eu lembrava e contava a história de seu Edézio. Obviamente riamos e sentíamos nojo do umbigo dele e do sapo que ainda se encontrava perto da porta e ninguém tinha coragem de enxotar. E nesse domingo, por coincidência, tínhamos canjica no café da manhã.